“Acredito que se há algum tipo de Deus, ele não estaria em nenhum de nós, não em você ou em mim, mas nesse pequeno espaço entre os dois. Se há algum tipo de magia nesse mundo, deve estar na busca de compreender alguém, compartilhar algo” - Céline, a personagem de Julie Delpy em Antes do Amanhecer
Em 1995, Richard Linklater lançou um filme independente simples e maravilhoso acompanhando dois viajantes (Ethan Hawke e Julie Delpy) que se conhecem em um trem e decidem passar uma noite juntos em Viena. Assistimos enquanto os dois se apaixonam, conversa por conversa, e depois o diretor iria se reunir com a dupla mais duas vezes para mostrar como estaria o relacionamento do casal em intervalos de nove anos.
Em uma das conversas do casal, Céline fala a citação que abre esse post. Antes de pensar sobre a precisão teológica de seu discurso (são muitas as passagens do novo testamento que afirmam que Deus habita em nós), é legal pensar na beleza da citação. Encontrar a Deus como uma tarefa comunitária, de relacionamento, conhecendo-O melhor a partir de nossas relações e amizades. Enquanto Ele habita em nós, também podemos conhecê-lo mais profundamente nos relacionando com os outros.
Não acho que uma coisa anule a outra. Deus não só pode como está em nós e fora de nós (“nEle vivemos, nos movemos e existimos”, At. 17:28). Ou seja, nas palavras da anacoreta (monge) Juliana de Norwich, Deus “habita alegremente e sem fim” em nossa alma, e Ele é “o fundamento em quem nossa alma repousa”.
A frase de Céline me lembra algo que o pastor Ed René Kivitz pregou: 1 João 4:8 nos conta que Deus é amor. Se Ele é amor, não pode ser sozinho, já que o amor só existe em relação. É impossível ser feliz sozinho, já cantava Tom Jobim. Não dá para encontrar a “magia nesse mundo”, como diria a Céline, sem buscar estar em contato com outra pessoa.
O próprio Deus existe em relação: Pai, Filho e Espírito Santo, os três em comunidade, nos chamam para participar da dança junto. O triângulo se faz quadrado para encaixar a mim e a você. O amor não pode existir sozinho.
Portanto, se “aquele que não ama não conhece a Deus”, de acordo com o apóstolo João, eu só vou poder conhecer a Deus em relação com os outros, com as pessoas que Ele colocou ao meu redor. Não posso conhecer a Deus isolado, sem falar com ninguém, buscando a elevação asceta. Deus está na rua. Igreja é importante não porque é uma obrigação ou por ter algo de sagrado em si, e sim porque é uma reunião de pessoas decididas a amar a Deus enquanto amam umas às outras.
Não dá para encontrar a Deus sozinho. Não dá para amar a Deus sem amar os outros.
P.S.: assistam os três filmes que o Linklater fez com a Julie Delpy e o Ethan Hawke, são lindos demais.
Amo essa ideia de igreja ser um lugar onde as pessoas amam a Deus enquanto amam entre si, acho que a única vez que senti isso tão forte foi quando vou na Adventista com vocês. Tira muito da estrutura hierárquica que conheço por religião e eh algo realmente lindo. Me deu vontade de rever First Reformed